A vida não começa num vagido assim como as manhãs não abrem no bocejo do sono que se pede mais. Antes disso, durante, e até ao estalar do interruptor que nos liga os olhos ao contacto das dimensões há toda uma rede de suporte que se traz na emoção de uma vivência. Só não sabemos de onde. Talvez da barriga da mãe, talvez da barriga dos sonhos, talvez do que todos os que ficaram para trás de nós acumularam e transportaram nas veias até ao sangue que nos oferecem por ser a nossa vez. Talvez à estupidez dos sonhos que não entendemos porque a maioria são emprestados e apenas nos limitamos a sentar sem pagar, assistindo.
Por favor! Não me chamem para conversar sobre desgraças nem doenças que eu não estou para isso! Que diabo! Acaso sou padre ou médico para ter que ouvir confissão ou prescrever meios complementares de diagnóstico?! Este interesse macabro pela tragédia dá-me vontade de dizer palavrões! Como é possível uma lingua tão rica como a nossa ficar sufocada nas palavras mirradas que servem para comunicar temas tão débeis como estes, se mal de nós mortais, Oh pobres mortais!, lá haveremos de malhar todos um dia, num qualquer drama e morte certeira? Vade retro!
Nada como uma andorinha a riscar de negro para abrir o céu no meu sorriso. As coisas mais simples desta vidinha. Foi vê-la e plantou-se um bom-humor que ninguém há-de arrancar. Tentem pôr-me cheia de não-presta e solto os cães. Não há frio ou mar de chuva que hoje caia que endureça o calor que me derrete por dentro e o amor que sinto pela cidade, pelos olhos que alcançam as cores, o nariz que diferencia os cheiros bons e maus, tudo o que me rodeia e me faz gente. Logo mais quando pegar no lápis e disser com palavras felicidade, hei-de mordiscar a ponta e recordar de novo o traço da memória, a negro, para sublinhar a diferença do dia bom.